sábado, 13 de dezembro de 2008

06 de Dezembro

Entrávamos assim ao anoitecer na primeira localidade da nossa viagem. Nem S nem L, seguiríamos portanto em frente após Vila Nova de Briteiros. A vila era um local deserto e assustado com as primeiras luzes públicas que se acendiam. A nossa estrada dirigia-se a um centro empedrado e frio. No jardim público os poucos, solitários e envelhecidos habitantes, dirigiam-se agora, dispersos, para um jantar num local tão incerto para eles como insuspeito.
- Sara, não queres jantar aqui? - Perguntei.
-
Pensava no mesmo, não comi nada toda a tarde .
- Nervosa com viagem? - Fiz a pergunta apesar de dificilmente a imaginar nervosa com algo.
-
Não, apenas demorei muito tempo a fazer as malas.
- Trouxeste então muitas coisas? Como reparaste, não perdi muito tempo com isso...
- Sim, cerca de 6 malas. Ocupam toda a mala do carro, ainda bem que só trouxeste essa. - Sorriu novamente, desta vez para um ponto longínquo. Pela primeira vez pensei se ambos não teríamos em ideia viagens completamente diferentes.
Parámos o carro o centro da vila, quase ao lado da pequena e iluminada igreja. Confirmava-se a deserta terra. Do outro lado da rua, avistava-se uma discreta pensão com um restaurante em baixo, e nada mais parecia aberto.
- Luís, porque não ficamos hoje aqui? - Não me parecia um local interessante para visitar, mas servia perfeitamente para descansar.
- Parece-me excelente… - Saímos do carro. Dirigimo-nos à bagageira do carro, que ela abriu.
- Vais levar todas estas malas? - Perguntei
- Não, apenas preciso desta. - A resposta intrigou-me, para que serviriam as restantes. Tirei a pesada mala que carreguei para a pensão.
Abri a porta. No alto balcão de madeira da recepção faltava alguém de quem ouvíamos já os passos. Um grande aquecedor insistia em aquecer uma pequena sala de entrada onde não estava ninguém além de 3 revistas já com alguns meses. Olhámos um para o outro e acho que pela primeira vez ambos sorrimos ao mesmo tempo pela surreal experiência da qual éramos os únicos responsáveis. Apressadamente, chegou uma senhora que imediatamente disparou mesmo antes de olhar para nós:
- Não, acho que este ano também não vamos lá.. Os outros concorrentes são melhores. Pela televisão alta ao fundo, percebi que acompanhava algum programa de televisão, de algum concurso que não corria propriamente bem à pátria lusa.
- Tem quartos livres? - perguntou a Sara
- Menina, temos todos os quartos livres - respondeu desalentada, agora não só com o concurso, mas com o negócio da pensão.
- Queríamos dois então.
- Concerteza. - disse ela enquanto escrevinhava algo com um minúsculo lápis numa rasurada folha.
- Diga-me uma coisa, o restaurante está aberto? - Perguntei.
- Não está não, só o bar, mas se quiserem daqui a pouco baixo para fazer alguma coisa.
- Se não lhe for incómodo.. - disse a Sara
- Claro que não, esperem só um pouco até acabar de ver o concurso.
-
Óptimo, nós vamos levar as nossas coisas para cima.
Deu-nos as chaves, enquanto, impaciente, desaparecia atrás do balcão. Subimos com as malas enquanto ao longe, a ouvíamos já a ralhar com o televisor.
- Vemo-nos em 20 minutos no restaurante, que achas? - Disse a Sara.
-
Acho óptimo.
Cheguei ao tal número 14 da estranha chave, deitei-me um pouco, sem reacção na pequena cama do azulado quarto, que apesar de tudo, era muito confortável e espaçoso. Cada vez me parecia mais estranha a experiência de viagem, mas a intuição de que seria fascinante, era agora mais forte que nunca. Desci passado algum tempo para o restaurante, ainda faltava algum tempo para os tais 20 minutos. O restaurante ficava imediatamente ao lado da pensão, e naquela deserta terra, obviamente que o encontrei deserto. “Talvez toda a gente esteja a ver o tal concurso” Pensei. Desta vez havia alguém ao balcão, um senhor já idoso.
- Está na pensão e vem para jantar, não é? A cozinheira já me disse, ela já vem.
- Sim, não há pressa - De facto não havia mesmo. O senhor desapareceu no bar, deixando-me novamente sozinho.
Comecei a ler, sem interesse, o jornal que ali estava, mas que inclusivamente já tinha lido de manhã, na agora já longínqua Lisboa. Passado pouco tempo, aproximava-se a Sara. Vinha desta vez com o cabelo amarrado. Ficava-lhe igualmente bem.
- Posso me sentar? - Disse sorrindo.

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Assim de repente: um conto online onde escrevem dois estranhos, que se encontram apenas num blog, na época mais deprimente do ano.